18.05.2023

“Eu percebo agora o quanto fui duramente julgada” Miley Cyrus sobre encontrar a sua paz – e fazendo o álbum do verão.

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A reputação de Miley Cyrus como a talentosa princesa da TV que se tornou uma estrela pop provocante pode precedê-la, mas por trás das histórias, das canções e das manchetes, Giles Hattersley descobre uma mulher em paz consigo mesma. Fotografias de Steven Meisel. Estilização por Edward Enninful.

Miley Cyrus surge na sala em um vestido preto Saint Laurent e um chapéu estilo Gucci de meio metro na cabeça.

“É doido”, diz ele de forma retórica, com o delicioso e familiar sotaque rouco e sulista que só milhões de anos como celebridade poderia fazer. Simplesmente servindo toda enfeitada ao redor do 33º andar do The Ritz-Carlton New York, NoMad, sentada com o seu canto criativo, o indispensável “cobertor confortável” de 5 homens que incorporam o tipo de boemia moderna de Hollywood que ela adora e com quem ela vai a todos os lugares. Eles oferecem consenso: sim. Só para ter certeza, ela desfila pelo quarto de parede a parede, os olhos disparando.

Cyrus – agora com 30 anos (como assim ela só tem 30?) com muitos momentos de glória, sem sentido, trauma, e bons momentos para carregar – está num momento de se mostrar uma garota. Até o momento, pelo menos. Minha palavra, ela é um gás. “O que tem na arte?”, ela pergunta entre poses, se sentindo ofendida pelas marcas em uma foto. Então ela se vê no na tela do iPhone de Stephen Galloway, aclamado coreógrafo e seu amigo. “Está parecendo Pam Tillis”, ela decreta, acariciando o capacete alto e fofo, par a alegria de sua equipe, antes de falar algo engraçado e fofoqueiro sobre a tal Pam, a cantora country que conheceu recentemente e pediu para passar seu melhor para sua madrinha, Dolly Parton, o que, claro, ela fez. Dolly respondeu “Ah meu Deus, a Pam, quanto tempo não a vejo!”

“Mas então”, diz Cyrus com alegria, “Eu entrei no Instagram da Pam e o que você vê? Uma foto recente dela com a Dolly” Country shade,” ela diz sobre sua amada Dolly: “Você não pode brigar por isso.” Ela mergulha na cama ao meu lado, balançando seu cabelo bagunçado e sexy. Calma. O monólogo continua: “Arte de poeira de dinossaura”; “Não são esses brincos”; “Eu vou sair de turnê? Sim, a turnê do Hotel Aman. Cantando na entrada com uma massagem complementar.”

A saber: um gás. Apesar de que você não consegue não notar que ela leva cerva de 20 minutos para sustentar o contato visual que dura mais que um segundo. Ela não é, claramente, uma pessoa que gosta de novidades com estranhos, que não confia de primeira. Francamente, por que ela confiaria?

Mas, enquanto a energia inicial é remota e rápida, não leva tempo nenhum para estar fixado nela. Extremamente famosa desde a pré-adolescência, a sua fama é compreendida, talvez,  apenas por algumas pessoas que tiveram uma fama relativamente rápida. Seu primeiro instinto é de alguém que interpreta uma emocionante falta de frieza com uma neurose de estrelismo infantil induzida pela mídia tóxica. Mas ela não é nada disso.

A desgastada narrativa do triunfo e sobrevivência de uma mulher famosa? “Básico pra caralho!” Algum tempo depois, quando só nós dois estávamos conversando, ela diz, “Uma coisa que não gostaria que essa matéria virasse seria uma reclamação de ser uma mulher da indústria. Eu não preciso disso para ter uma história de empoderamento. Eu uso meu empoderamento todas as vezes. Eu não preciso gritar isso.”

“Eu carreguei muita culpa e vergonha de mim mesma por anos por tanto problema e controvérsia que causei.” 

Na verdade, ela é sábia, inteligente e imprevisível, propensa a achar todo o maquinário da fama ridículo e prejudicial – principalmente para as mulheres. Ela está cansada de se engajar ou até de falar sobre isso tudo. Certamente do modo tradicional da imprensa. “Por que eu estaria na Vogue Britânica?” ela se pergunta em voz alta mais tarde, só nós dois no sofá. “Por que eu sequer faria uma entrevista?”, ela se mostra realmente curiosa por estar aqui.

Bem, sinceramente. Ela estava morrendo de vontade de ser fotografada por Steven Meisel. Ela também parece estar amando um dos seus anos de maior sucesso em toda a carreira como cantora, para não dizer da sua chegada num novo nível do mundo da moda, graças aos looks do especial de ano novo e algumas aparições especiais, principalmente o desfile da Versace em LA alguns dias antes do Oscar (ela é rápida em creditar seu estilista pessoal, Bradley Kenneth’s nos seus recentes looks matadores).

Então, temos “Flowers”. Enquanto escrevia, a música – um single de retorno viciante que foi diretamente para o nível clássico – passou 8 semanas no topo da Billboard, com mais 10 semanas consecutivas em número 1 no Reino Unido. No início de Maio, ela se tornou a música mais rápida da história do Spotify a atingir bilhões de streams.  Lançada em Janeiro, a essa altura ela tem o poder de ser lembrada como a música do verão. Quem sabe. Dado o nome do álbum Endless Summer Vacation – o que, para Miley, é muito mais um mantra de estilo de vida do que título de álbum – talvez realmente seja lembrada.

Ela atingiu seu mais recente momento de sucesso na internet sem sequer fazer propaganda. Chefe, né? Ao invés disso, ela simplesmente lançou a música e deixou as mídias sociais devorá-la viva. A música de amor próprio e triunfo pessoal é realmente uma resposta ao seu ex-marido, o ator australiano Liam Hemsworth? A jaqueta em que aparece usando no clipe que já tem mais de 435 milhões de visualizações no Youtube (e segue crescendo), dirigido por Jacob Bixenman e com toques de Helmut Newton e Michael Mann, é realmente de Liam?

Ela não tem tempo pra isso. “Eu nunca precisei ser especialista na arte de enganar uma audiência”, ela diz dando de ombros. “Isso vai pegar fogo sozinho”. Em vez de fazer um diário de experiência pessoal, ela apenas quis fazer uma música que fosse ouvida. “Eu a escrevi de um jeito bem diferente. O refrão era, na verdade: ‘ ‘I can buy myself flowers, write my name in the sand, but I can’t love me better than you can.’ [Eu posso comprar minhas flores, escrever meu nome na areia, mas não posso me amar mais do que você]. Era bem mais anos 1950. Música mais triste. Tipo ‘Claro, eu posso me amar, mas você é muito melhor’”, ela diz. No fim ela rejeitou a melancolia. “A música é meio minta até que seja verdade,” ela diz. “O que sou uma grande fã.”

Ela percebeu de imediato que seria um hit – “Eu tenho feito isso faz um tempo” – e na noite do lançamento ela foi dançar com uma turma no Sunset club  no The West Hollywood Edition. “Eu estou sóbria. Eu não bebo, eu não… sabe, mas eu comemoro. Era uma da manhã e o Lil Nas X entra na balada e me pergunta algo interessante. Ele disse: ‘Você está ansiosa pelo tamanho do sucesso de Flowers?’”

Ela pensa nisso de novo agora. “eu tava tipo, ‘Não, eu talvez não seja a número 1 agora, mas número 2 vai rolar.’ Tudo é momentâneo,” ela diz, seus olhos azul-acinzentados finalmente mirando os meus. Ela pensa que todos nós precisamos ser mais honestos sobre o falso Deus do sucesso momentâneo – até as estrelas do pop. “Muitas manchetes recentemente disseram ‘Esse é o momento da Miley’, e eu to tipo ‘É exatamente o que é. É um momento e vai acabar.’”

“Isso não é pessimismo,” ela continua, sorrindo. “Isso é honestidade e está tudo bem para mim. Eu, na verdade, prefiro isso. Eu não gosto de ser grande.” Quando Endless Summer Vacation foi lançado, ela não estava em LA e não tinha seu celular com ela. “Meu namorado levou seu celular e eu não. Eu não fazia ideia de como estaria nos rankings e não era importante para mim porque não teria mudado nada. Alguém poderia dizer, ‘seria esse número se você fizesse isso, ou tal número se vendesse sua alma…’” Ela encolhe os ombros novamente. “Eu já estive no Jardim do Edén antes e comi a maçã vermelha, e nunca é bom.”

“Eu quero viver a minha vida para o meu prazer ou dos outros?” 

E aqui estamos. A primeira entrevista de Miley em algum tempo e ela estaria doida se se vendesse para mim ou você. Ela sabe bem como é o jogo. Eu não tenho certeza se alguém que atingiu o tamanho da fama como adolescente na indústria poderia entender isso melhor. Primeiro, claro, veio a Hannah Montana em 2006. O programa de sucesso maluco da Disney, em que ela interpretou uma cantora pop adolescente com uma vida dupla, tornou-se um fenômeno tão grande que ela lotou estádios em todo o mundo em questão de segundos (a turnê Hannah Montana & Miley Cyrus: Best of both worlds Concert virou a maior venda de shows relacionados a filmes de todos os tempos). Filha do cantor country Billy Ray Cyrus, tem como produtora sua amada mãe Tish desde o dia um, enquanto sua vida adolescente era uma mistura da vida calma no Tennessee e um dia de trabalho de fama, com um toque de interesse público lascivo e moralmente confuso em sua maioridade que era, mesmo na época, distintamente grosseiro.

Certamente isso é muito para alguém lidar, mas eu diria que isso fez Miley ser muito esperta. Ela é única entre todos que já entrevistei sobre seu acesso à fama; ela é quase “Neo-esque” em sua habilidade de ver o código verde na matriz à sua volta. “Eu realmente não sou uma pessoa que busca atenção, sentada aqui com meus 30 anos,” ela diz. Miley está ciente que sua fama no início da vida adulta, enquanto sentava pelada numa bola de demolição para o vídeo de Wrecking Ball ou sua apresentação de Twerk no VMA de 2013, ainda ocupa um espaço relevante na opinião do público. “Eu criava atenção para mim mesma porque eu estava me separando de um papel que eu tinha antes. Todos, nos seus 20 ou 21 anos sabe que tem mais a se provar. ‘Eu não sou meus pais’ ‘Eu sei quem eu sou’.

Ela continua para explicar sua mudança: “Eu carreguei muita culpa e vergonha de mim mesma por anos por tanto problema e controvérsia que causei,”  ela diz. “Agora que sou adulta eu entendo o quanto fui duramente julgada. Eu era muito julgada como criança por adultos e agora, como adulta, eu entendo que jamais julgaria uma criança.”

Seu tom é de uma pessoa que já entendeu sua raiva. Mas WOW. Algumas vezes ela ri disso. Um amigo a perguntou sobre conselhos sobre a pele recentemente  e, brincando em sua resposta, ela enviou uma matéria de 10 anos atrás em que a matéria realçava suas espinhas com a manchete “Um ano de mudança (breakout)!” Jesus. “Não é? Quem pensava que eu não era uma pessoa que não se magoaria com isso? Eu era literalmente uma garota de 20 anos. Claro, aos 20 eu era igual toda pessoa de 20 anos. Você acha que cresceu, m mas agora eu sou tipo ‘Ah não, eu era uma criança idiota.’” Ela ainda se sente estranha sobre o que vê publicado sobre ela. “Eu estava lendo essa coisa outro dia sobre mulheres na indústria que não têm filhos e eu estava na lista,” ela diz, junto com Helen Mirren, Oprah Winfrey e Dolly. Sua saída? Ela cansou de tentar mudar suas ideias e tomadas de decisões para tentar fazer todos felizes.

Interessante que, para alguém com mais de 207 milhões de seguidores no Instagram, isso vai para os seus fãs. Não a entenda errada. Ela é grata. Mas ela diz que não pode mais viver a vida para eles. Ela ama uma audiência, mas não da forma que ela cresceu. “Olha, o kiki me segue em qualquer lugar que eu vou,” ela comenta sobre Galloway, Bixenman e Kenneth, assim como Bob Recine e James Kaliardos (seu time de cabelo e maquiagem), todos que estão trabalhando aqui hoje. “Eu amo me apresentar, mas muito para eles,” ela diz sorrindo. “Cantar para centenas de milhares de pessoas não é exatamente o que eu amo. Não tem conexão. Não tem segurança.” Eu imagino que seja muito difícil agradar 100.000 pessoas ao mesmo tempo. “é isso”, ela diz concordando. “Não é natural. É tão isolado porque se você está na frente de 100.000 pessoas, então você está sozinho.”

Cyrus é conhecida por entregar tudo em uma turnê. Ela se apresenta por horas, aceita pedidos, não sai do palco enquanto não tem certeza que todos tiveram a noite da sua vida, indo de “We Can’t Stop”, para “Party in the USA” e derramando lágrimas em “The Climb”. Agora ela não tem certeza que pode fazer isso ainda; certamente não em breve. “Foi um minuto”, ela diz sobre seus anos de hiatus. “Depois do último show em 2014, eu olhe mais como uma pergunta. E eu não posso. Não só não posso,” ela se corrigem “porque não poder é sua capacidade, mas é sobre minha vontade. Eu quero viver minha vida para o prazer dos outros ou o meu? E, sabe o que…” ela deixa a conclusão no ar.

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Isso a levou de uma abordagem fascinantemente radical para uma mega carreira pop moderna. Durante a última década, ela lançou suas melhores músicas – Nothing breaks like a heart, midnight sky, flowers (claro) – enquanto seu talento vocal nunca foi tão incrível e aplaudido. Todos, de Elton John para Gloria Gaynor, a coloca como um dos melhores vocais da indústria. Mas sua vida agora, como explica, está dedicada à sua própria felicidade. O ciclo tradicional de álbum, turnê e colaborações estratégicas estão parados com pouco interesse. O trabalho que ela escolhe fala sobre sua experiência.

Cystus e Hemsworth se separaram em 2020 e, apesar de todas as teorias do twitter, ela tem alergia das pessoas verem Endless Summer Vacation, ou qualquer música recente, sendo diretamente ligada a esse relacionamento. “Eu não apagaria minha história e nem gostaria que apagassem”, ela diz sobre seu relacionamento de 10 anos chegando ao fim. “Ter uma vida interessante faz com que a gente tenha história interessante,” ela adicionada, explica que ela se vê  mais como uma romancista do que colocando numa música. Alguns verões atrás, ela começou a namorar Maxx Morando, baterista da banda Liily e um grande produtor e compositor, a quem ela fez grandes declarações públicas. “Nós fomos colocados num encontro às cegas”, ela comenta sobre como se conheceram. “Bem, foi às cegas pra mim, não pra ele realmente. Eu pensei, ‘o pior que pode acontecer é eu ir embora.’” No meio da entrevista, seu celular começou a tocar com a música “Tyrone” de Erykah Badu. “Eu chamo de ‘toque sexy de namorado’”, ela diz sorrindo. 

“Muitas manchetes disseram, ‘Esse é o momento da Miley.’ E eu tipo ‘É exatamente isso.’”

Agora, a Miley mora numa casa maravilhosa em LA, rodeada de suas artes, seu armário cheio de looks fashions, e uma porta de amigos e família. Ela adora o mundo fitness – tudo de treinos ViPR para TRX para dançar e com parceiro, então ela sempre tem amigos para treinarem com ela. Ela não se define em nenhum gênero; alguns anos atrás ela inundou matérias com a ideia de ser pansexual, mas parece que evoluiu para além de uma definição exata. Ela diz: “Eu só saio com tipo, homens gays. Então eles vêm, então fazemos uma grande aula ao som de Nicki Minaj ou uma série de Britney. Eu tenho uma série de Vogue da Madonna que seria fazer todas as coreografias com pequenos pezinhos.” Ela ri.

Todo mundo pede dicas de exercícios, mas ela oferece com um pouco de sal. “Eu tinha essa ideia de fazer tipo uma comédia de bem-estar, que seria basicamente dizer ‘Eu sou a Miley Cyrus e eu sou uma estrela do pop e eu não posso te dizer o que comer ou quais suplementos tomar porque eu não vi seus exames’.” Ela pega o celular e lês para mim: “Eu faço escolhas que me orgulham por me proteger… Eu coloco minha saúde mental e física à frente de um pagamento… Eu pririzo espaço para eu estar com os meus amigos e família fazendo o que eu amo, que é exercícios, comer bem, aprendendo formas de enaltecer a minha vida, me dedicar a práticas e protocolos especificamente feitos para mim.” 

Ela trabalha com curadores “incríveis” e adiciona que recentemente: “Eu fiz muito EMDR.” Ela começou um movimento com os olhos, terapia de traumas de memórias antigas um ano atrás. “Me ajuda tanto,” ela diz. “Essencialmente, você apaga as sensações físicas ligadas com as memórias que machucam. O EMDR realmente me ajudou.”

Enquanto evita os clichês de estrela-infantil, ela concorda que sua vida não foi para frente. Seu corpo é feito de uma ferramenta e ela tem uma dor e inflamação crônica, que aparece sempre que está cansada. “Depois que o álbum lançou, eu tive um surto,” ela comenta de um episódio esse ano. “Eu estava com muita dor. Eu tinha ido para a festa de lançamento da Gucci, para Versace, sabe, minha força foi drenada e eu estava de volta à vida de super estrela e ai percebi o surto. E, então, quando foi esquiar, o que não faz o menor sentido porque é, tipo, super ativo, mas eu me senti muito melhor. Eu acho que é porque eu estava anônima na minha roupa de ski. Eu estava com meus óculos enormes, sabe, e ninguém nunca saberia que eu era.”

Sua melhor estraté é manter tudo real. Ela diz que recentemente um compositor veio pra ela com uma letra. “Era tipo, sabe, o padrão que bomba numa balada. E eu estava tipo, ‘Eu estou sóbria há 2 anos. Não é aí que eu passo meu tempo, sabe. É mais possível que me ache com meus amigos em jardins de rosas ou indo para um museu.’” Ela ri. “Não é sobre ser séria. Eu só evolui.”

Isso a inspirou a escrever uma música diferente. Ela espera lançar em breve, ela explica, enquanto comenta uma linha dela. Seu olhar é fixo e a voz calma. 

“Eu sei que era louca,” ela diz. “Eu sei que era divertida. Você diz que eu costumava ser selvagem. Eu digo que costumava ser jovem.”


Publicada por: Izadora Vasconcelos

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